Medicamento considerado milagroso causa tragédias ao redor do mundo

Talidomida não é submetida a testes mais rigorosos e entra no mercado provocando deficiências em fetos

A Talidomida é um medicamento perigoso, responsável pela deformação de fetos. A droga foi desenvolvida em um laboratório alemão e lançada no mercado consumidor no final da década de 50. Considerada como calmante e ansiolítico, a Talidomida foi largamente usada por gestantes para controlar as constantes náuseas e a tensão, típicas dos primeiros meses de gravidez.

No entanto, o alívio que se tinha no princípio transformava-se em desespero e angústia alguns meses depois. Ao longo dos anos 60, muitos bebês nasceram deformados, sem braços ou pernas, com deficiências na estrutura vertebral, cegos ou surdos.

Descobriu-se, algum tempo depois, que essas conseqüências eram provocadas pela Talidomida. A droga fora lançada no mercado sem, ao menos, ter sido submetida aos devidos testes de laboratório. Em 1961, depois de muitos protestos e manifestações, a Talidomida foi proibida no mundo inteiro. O Brasil, no entanto, voltou a produzir o medicamento em 65, sob o pretexto de auxiliar no tratamento de hanseníase (lepra). A fabricação da Talidomida seria supervisionada pelo Governo Federal e, assim, acreditava-se não haver qualquer perigo.

Todavia, as autoridades esqueceram-se que no Brasil é comum fornecer remédios sem receita médica. Também não é raro tomá-los por indicação de parentes, amigos ou de alguma vizinha. O fato de não ser vendida em farmácias; não freia os riscos de novas vítimas.

A Talidomida é distribuída nos postos de saúde sem uma fiscalização rígida. Para se ter uma idéia, os comprimidos vêm em cartelas; que não contêm qualquer bula sobre os efeitos colaterais gravíssimos que eles podem provocar. A única advertência é o desenho de uma mulher grávida com o símbolo de proibido, sem caixa ou bula. Dessa forma existem mulheres que pensam que o remédio é abortivo. No caso de gravidez indesejada, tomam a droga para interromper a gestação, sem saber que estão se condenando a gerar um feto com deformações.

Diante da desinformação e da falta de controle no fornecimento do medicamento, novos casos de crianças defeituosas por conseqüência da Talidomida continuam acontecendo. Mulheres em idade fértil, proibidas por lei de tomarem o medicamento, ainda usam a droga para aliviar enjôos e tensões. Absurdo é notar o descaso das autoridades em relação a esses acontecimentos. Não há qualquer indício de campanhas informativas que esclareçam a população sobre os perigos da Talidomida. Pelo contrário. As associações que reúnem as vítimas da droga esbarram o tempo todo na burocracia e na morosidade dos ógãos governamentais e chegam a esperar longos anos para ganhar algum benefício em lei.

Governo brasileiro patrocina produção da Talidomida no país

O Brasil é o maior fabricante de Talidomida do mundo e conta com o aval do governo. A droga, proibida em todos os continentes, é produzida em oito laboratórios: FURP (Fundação para o Remédio Popular), TORTUGA Companhia Zootécnica Agrária, ECADIL, FARBOM, Labogen S/A, Champion Farmoquímico Ltda. e Microbiológica Química Farmacêutica Ltda. e no laboratório da Fundação Ezequiel Dias (Funed), em Minas Gerais. Toda a produção é enviada ao Ministério da Saúde, que o redistribui às Secretarias dos Estados. Nas diretorias regionais das Secretarias, cadastradas para fazer a distribuição, o medicamento é encaminhado para os postos de saúde. Vale lembrar que a comercialização desse medicamento é legal.

A produção da Talidomida, que deveria destinar-se apenas à rede pública de saúde, também encontra lugar certo em farmácias de manipulação, que são cadastradas para fornecimento da droga sob retençao da receita médica. A informação é do Centro de Vigilância Sanitária da Secretaria de Saúde paulista.

Segundo informações oficiais, o controle na distribuição da Talidomida segue critérios rigorosos como a proibição de receitar a droga para mulheres em idade fértil e a anotação em livro próprio de todo remédio entregue aos pacientes. No entanto, o que se constata é diferente. A negligência em torno da distribuição da talidomida continua fazendo vítimas. O paciente, por exemplo, tem direito de levar a cartela de comprimidos para casa, o que representa um sério risco. A desinformação pode levá-lo a indicar o medicamento por conta própria e aí a tragédia vai se repetindo.

Fabricação

Quando começou a ser produzida no país, a droga era conhecida por três nomes diferentes: Sedalis, Slip e Cedrin. Três laboratórios distintos produziam os comprimidos e contavam com a autorização da União pois um orgão do Ministério da Saúde permitia a comercialização da Talidomida no país.

Em 1993, a Funed foi responsável pela produção de 2.348 caixas, o que totaliza 1.164 milhão de comprimidos. Ao sair do laboratório, todo o medicamento é encaminhado à Ceme (Central de Medicamentos), que controla a aquisição e distribuição da droga. A produção de 94 não foi divulgada pela Fundação que, através da assessoria de imprensa, definiu o assunto como “polêmico” e por isso não forneceria os dados solicitados.

Recentemente, a Funed lançou um projeto para modificar a embalagem do remédio. Segundo a assessoria de imprensa da Fundação, a advertência restringia-se a uma ilustração e era insuficiente para alertar, de maneira eficaz, a usuária. Após ter sido aprovado pelo Ministério da Saúde, o projeto está em vias de ser concretizado. Espera-se apenas um levantamento, que deve acontecer até o final do ano, para que as novas embalagens, mais seguras, entrem em circulação.

 

EnvelopeRemédio não traz advertência quanto aos riscos do consumo; ilustração confunde usuárias

Remédio não traz advertência quanto aos riscos do consumo; ilustração confunde usuárias

 

Membros superiores são os mais afetados pela droga

A ação da Talidomida na gravidez inibe o desenvolvimento normal do feto. A incidência maior do medicamento recai sobre os membros superiores (53% dos casos). O atrofiamento, tanto de membros superiores quanto de inferiores, representa 25% do total de deficiências, enquanto a surdez responde por 11%. Os outros 11% restantes dividem-se em casos mais raros como cegueira, atrofia apenas dos membros inferiores, má formação da estrutura vertebral e do tubo digestivo.

 

 

Médicos reconhecem os efeitos maléficos da Talidomida mas não condenam seu uso

Nenhum profissional de medicina deixa de reconhecer os efeitos maléficos da Talidomida. Segundo o endocrinologista Francisco Maia, de Belo Horizonte, Minas Gerais, essa droga, quando ingerida por gestantes, interfere na formação dos tecidos do feto e prejudica o pleno desenvolvimento da pele, músculos e estrutura óssea. O imunologista Charles Castro completa, dizendo que o medicamento impede a formação dos vasos capilares. “Desse modo, os órgãos ficam desvascularizados, ou seja, sem irrigação sangüínea, e o resultado é o atrofia “, ensina.

Apesar de a talidomida continuar sendo produzida no Brasil para o tratamento de hanseníase, seu perigo não deixou de existir. A distribuição do medicamento nos postos de saúde é feita, muitas vezes, à revelia e sem muito rigor. Os pacientes, em sua maioria desprovidos de qualquer informação, levam os comprimidos para casa, podendo comprometer seriamente o grupo de risco da talidomida: mulheres em idade fértil e, principalmente, aquelas que já estejam grávidas.

“A má administração da droga é o grande problema”, opina Charles. Para ele, enquanto houver desinformação quanto aos efeitos colaterais da Talidomida haverá também vítimas. A solução, segundo o imunologista, seria lançar uma campanha, distribuir folhetos informativos, instruir os funcionários dos postos de saúde, colar cartazes explicativos, reformular a embalagem do remédio, advertindo o usuário. É tudo o que a Associação Brasileira das Vitimas da Talidomida quer.

Francisco Maia defende que “todo médico consciente sabe que é proibido receitar Talidomida a mulheres em idade fértil.” O problema é que, no cotidiano dos postos de saúde, a conscientização cede lugar ao famoso “jeitinho brasileiro”, onde tudo se consegue com um pouquinho de lábia. A droga acaba sendo distribuída sem o controle devido.

Os médicos não querem a abolição total da Talidomida, pois a droga, além de utilizada em hansenianos, está sendo introduzida nos tratamentos de outras doenças de pele e até mesmo da Aids.

Como argumenta Charles Castro, “todo medicamento tem suas propriedades positivas e negativas. Basta saber usá-lo adequadamente para que não se corra qualquer risco. ” Espera-se apenas que a Talidomida possa ser controlada e venha somente gerar beneficios para os usuários.


Caixa, Embalagem e Avisos da Talidomida

 

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Caixa da Talidomida

    
Envelope da Talidomida

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